Cirurgia na doença de Parkinson: para quem, e quando?

A cirurgia de Estimulação Cerebral Profunda, também conhecida da sigla em inglês DBS (Deep Brain Stimulation) ou marca-passo cerebral é um tratamento que pode melhorar muito a qualidade de vida de pessoas com doença de Parkinson. Todavia, não são todas as pessoas com Parkinson que se beneficiam desse tratamento. Então, quais são as pessoas que podem melhorar a qualidade de vida após a cirurgia, e, principalmente, quando essa cirurgia deve ser indicada?

A cirurgia de DBS na doença de Parkinson tem três critérios de indicação e cinco pré-requisitos. O que isso significa na prática? Significa que a pessoa com Parkinson precisa ter pelo menos uma das três indicações e todos os cinto pré-requisitos. Caso a cirurgia seja indicada sem obedecer essa regra, existe uma grande chance de o paciente não notar qualquer melhora em sua qualidade de vida e, pior ainda, ter uma piora dos sintomas!

As três possíveis indicações cirúrgicas são (lembrando que o paciente só precisa ter uma):

  1. Flutuações motoras apesar de terapia medicamentosa otimizada: as flutuações motoras são comuns em pessoas com doença de Parkinson moderada e avançada, e podem ser grande fonte de sofrimento. A primeira e mais comum das flutuações motoras é o encurtamento do efeito da levodopa, também chamado de wearing-off, em que o paciente precisa tomar levodopa muitas vezes ao dia para compensar essa diminuição da duração do efeito. Isso acaba sendo complicado, principalmente se lembrarmos que a levodopa precisa ser idealmente tomada de estômago vazio. A outra flutuação motora são as discinesias, que são movimentos involuntários semelhantes a uma dança, podendo atingir só uma parte do corpo ou todo o corpo do paciente. As discinesias costumam ser mais intensas no pico de ação da levodopa (cerca de 30-60min após o paciente tomar o comprimido). Às vezes uma boa neurologista especialista em Parkinson pode, ajustando os remédios, resolver esse problema por ora. Todavia, nos casos em que chegamos no limite das medicações, ou se esse ajuste significa que o paciente precisa tomar remédio mais de 5 vezes ao dia, chegamos à indicação cirúrgica por flutuações motoras. 
  2. Tremor refratário: o tremor é um sintoma da doença de Parkinson que costuma exigir doses maiores de medicações para melhorar. Se a pessoa já está com uma quantidade grande de medicações, e essas medicações foram otimizadas por neurologista especialista em Parkinson, chegamos à indicação cirúrgica por tremor refratário. 
  3. Intolerência medicamentosa: essa é a indicação mais rara de todas. Todo remédio por ter efeitos colaterais. Alguns raros pacientes não toleram nenhuma das medicações para doença de Parkinson – ou toleram poucas, e em doses baixas, insuficientes para que haja controle dos sintomas. Novamente, em alguns casos, o manejo das medicações feito por profissional expert no assunto pode contornar esse problema. Todavia, caso isso não seja possível, chegamos à indicação cirúrgica por flutuações motoras.

Os cinco pré-requisitos para indicação de DBS em pessoas com doença de Parkinson são (lembrando que a pessoa precisa ter todos os pré-requisitos!)

  1. Diagnóstico de doença de Parkinson: existe algumas outras doenças que causam sintomas semelhantes à doença de Parkinson, mas que não melhoram com DBS. Por isso, é preciso ter o máximo de certeza possível de que a doença daquela pessoa realmente é Parkinson. Para que isso aconteça, é importante que o diagnóstico de doença de Parkinson seja feito ou corroborado por neurologista especialista. Assim, evitamos ao máximo submeter o paciente a uma neurocirurgia que não lhe trata benefícios
  2. Mais de 4 anos do diagnóstico de Parkinson: esse limite existe exatamente para nos ajudar a diferenciar a doença de Parkinson daquelas outras doenças que não respondem à cirurgia de DBS. Essa diferenciação pode ser especialmente difícil no início da doença. Por isso, esperando um mínimo de 4 anos, diminuímos a chance de termos um diagnóstico errado. 
  3. Resposta maior que 35% no teste de sobrecarga à levodopa: a cirurgia de DBS traz os mesmos benefícios que a levodopa. Mas então por que fazemos a cirurgia? Aí voltamos às indicações: para pacientes com flutuações motoras, tremor refratário ou intolerância medicamentosa. Por isso, para tentarmos predizer como o paciente vai ficar após a cirurgia, fazemos o teste de sobrecarga à levodopa. Nesse teste, pedimos ao paciente para vir em consulta cerca de 12h sem tomar medicações para o Parkinson. Nesse momento, fazemos um exame especial do paciente, que mede a quantidade de sintomas do Parkinson em valores numéricos. Após, damos uma sobrecarga de levodopa. Quando a levodopa faz efeito, repetimos o exame. O resultado do exame da pessoa com os efeitos da levodopa (ON-MED) deve ser 35% menor (menor é melhor) do que o resultado do exame da pessoa sem os efeitos da levodopa (OFF-MED). Existem algumas exceções à essa regra, que devem ser discutidas caso a caso. 
  4. Ausência de doenças psiquiátricas e cognitivas graves: não se deve indicar a cirurgia de DBS a pacientes que tem doença de Parkinson e tem quadro demencial, ou se tem algum tipo de doença psiquiátrica grave e descompensada, como depressão, esquizofrenia ou transtorno bipolar. Tomamos esse cuidado, porque a cirurgia pode piorar essas doenças caso elas estejam descompensadas.
  5. Condições sociais de seguimento: a cirurgia de DBS, por si só, não melhora em nada os sintomas da doença de Parkinson. A cirurgia só implanta um eletrodo no cérebro do paciente, que precisa ser programado. Essa programação não é simples, e o profissional idealmente passou anos de sua vida aprendendo a fazer essa programação. Ao mesmo tempo, por melhor que seja o profissional, essa programação não é rápida. Demora alguns meses depois da cirurgia para que cheguemos à programação ideal. Além disso, a doença de Parkinson não para de evoluir por causa da cirurgia, então a programação do paciente também precisa evoluir junto. Dessa forma, um paciente com doença de Parkinson que fez a cirurgia de DBS precisa de visitas regulares ao neurologista, especialmente nos primeiros meses após a cirurgia. Por isso, o paciente precisa ter condições sociais para manter esse acompanhamento regular. 

E aí, você acha que tem alguma das indicações, e acredita que preenche os pré-requisitos? Marque uma consulta com profissional especializada para discutir sua indicação cirúrgica e melhorar sua qualidade de vida!

E aí? Gostou do conteúdo. Não esquece de assistir o vídeo sobre esse assunto no meu canal do YouTube!

Até a próxima!